sábado, 27 de março de 2010

Perguntei a um pastor

Perguntei a um pastor
que olhava o gado:
Que fazes agora,senão apascentar?
Conto as estrelas mais belas
No céu a brilhar.
De dia? Perguntei admirado.
De dia e a qualquer hora!
Então vim... a olhar para cima.

domingo, 21 de março de 2010

Palavras de outrora

Palavras que disse e já não digo
Em harmonia, numa bela entoação,
Palavras levando ao colo consigo
Alegrias e tristezas do meu coração.

Palavras, levando em si a palavra amor,
Levou-as o vento, a uma galáxia distante,
A um ínfimo grão de areia, a uma flor
Só, em solo árido, num deserto quente.

Palavras, levando dores da minha dor
E a esperança no meu peito erguida,
Entoando canções de uma paixão olvida,

São palavras ocas em ecos de outrora
Provindas de lugares que não são de agora
Onde me sento e aguardo o fim da vida.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Paixão louca

Conheço um grupo sem cura,
Um grupo de amores louco,
Uma perfeita loucura.

Uns, são amados por aquelas
Que gostam doutros, eu digo,
Dos que amam outras elas
Que os querem como amigos.

A Maria ama o José
E o José outro alguém ama.
Não sabe de onde ela é
Nem sequer como se chama.

Apaixonou-se o João
Pela prima do Frederico
Mas tem esta uma paixão
Por um rapaz mais lindo e rico.

O Carlos gosta da Tina
E a Tina nem o quer ver.
Gosta dele a Felizmina
Mesmo sem o conhecer.

Ama a Mafalda, o Geraldo,
O Geraldo, ama a Marzé.
É amada pelo Arrenaldo
A Maria que ama o José.

A Tina gosta daquele
Que o ama a Marzé.
Quando ambas estão perto dele
Normalmente há banzé.

Ri-se, contudo, o António
(Não lhe prende o coração)
De tão grande pandemónio
Causado pela paixão.

São amores com tanta incúria
Que, ao invés de alegria,
Trazem consigo balbúrdia
À vida do dia-a-dia.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Libertar II

No fundo do túnel, termino o caminho.
Chegarei cansado
Chegarei sozinho.
No fundo do túnel, termino o caminho
Se, aqui sentado,
Não morro ou definho.
Vou continuar
Mesmo com os pés dormentes,
As mãos em ferida,
Os olhos lacrimejantes.
É o desígnio da vida.

terça-feira, 2 de março de 2010

O cão que queria voar

No sopé de uma encosta
Já sem vida, o cão piloto,
Resgatei-o (ao cão) já morto.

Na cauda amarrava um leme
Com fio fino de norte.
De papel eram as asas
Reforçadas pelas abas
Com placas de fibra forte
Duma liga ultra-leve.
Era presa numa haste,
Nas costas, a ventoínha
E para evitar o desgaste
Segurava-a uma linha.
Nos olhos, um par de lentes
Em óculos de ciclista
Protegiam-no, defendentes,
Do vento que faz na pista.
Com uma boina na cabeça,
Parecendo um aviador
Batia ferozmente as asas,
Sem ser preciso motor
Ou algo que se pareça.
Nas patas, uns rolamentos
Serviam para a aterragem
E, para a grande viagem,
Um saco com mantimentos.
Com o pêlo penteado,
Um sorriso tão brilhante
E um ar bem asseado
Levou o seu sonho avante:

Num balanço, atirou-se
Duma escarpa, pelo ar.

Oh tristeza! Estatelou-se!
O cão que queria voar.